O Livreiro de Cabul é retrato de uma realidade
No fim de semana, acabei de ler "O Livreiro de Cabul", de Åsne Seierstad, o primeiro da lista de livros para o semestre. Com toda uma veia jornalística na forma de escrever, a autora mostra como acontecem coisas corriqueiras no dia a dia do Afeganistão, humanizando as histórias com seus personagens reais: não é um romance, são relatos muito bem contados.
Relatos reais e imparciais de pessoas diretamente ligadas a Sultan Khan, o tal livreiro de Cabul. Compreendo que ele tenha processado a autora: o homem se acha à frente de seu tempo por colecionar e defender seus livros, por achar que a história de seu povo está ali, entre todos os livros que salvou ou copiou, mas não deixa seus filhos irem à escola para cuidarem de suas livrarias. Ler sobre si mesmo e se ver como um tirano deve ser muito difícil. E realmente ele é um afegão em todos os aspectos, principalmente em seu machismo. Sem que ninguém da família possa contrariá-lo, nem percebe o mal que faz a todos. Acredito que, lendo o livro, ele teve outra visão de si próprio.
Ao mesmo tempo, não é culpa dele: a religião (que ele não segue cegamente) e a cultura do país o fizeram ser assim. Os acontecimentos no livro são logo após a queda do Talibã e as mulheres ainda tinham medo de não usar a burca, por acharem que se tornariam impuras, sendo vistas por outros homens. Os rapazes ainda têm medo de terem pensamentos "sujos" com outras mulheres, o que também os torna impuros.
E ainda ficamos sabendo de histórias que nem são tão contadas por aqui: as burcas não surgiram do Alcorão - foi um sultão do começo do século passado que, não querendo que as 200 mulheres de seu harém fossem vistas por todos, inventou burcas bordadas e enfeitadas para que elas usassem. A elite gostou e copiou. Os pobres acharam bonito se vestir como os ricos e também copiaram - e depois disso, o Talibã resolveu tornar obrigatório. Nos anos 70, os afegãos usavam roupas ocidentais e recebiam visitas de muitos turistas hippies (muito interessados no haxixe, diga-se de passagem).
O que mais choca são as amputações que acontecem por causa de uma cultura: como as mulheres viviam escondidas em suas burcas, dentro da casa de suas famílias, os jovens não têm contatos antes do casamento (a não ser com as viúvas que vendem seu corpo para sobreviver, já que eram sustentadas pelos maridos). E por não terem como "namorar", muitos procuram outros homens: o homossexualismo é muito difundido no sul do Afeganistão.
É uma boa forma de ter uma visão real (e triste) do que acontece por lá: eu recomendo!
![]() |
É uma boa forma de ter uma visão real (e triste) do que acontece por lá: eu recomendo! |
Marcadores: Literatura para leitura