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6.3.07

Licença para gostar


Marta Gêes, jornalista e escritora, escreveu um ótimo artigo na edição de fevereiro da Revista Bravo.

Alguns trechos:

“... Um jornalista influente, assistindo a uma peça de teatro, pergunta, com alguma ansiedade, à sua editora, sentada na fileira em frente: ‘Nós estamos gostando?’. A história fazia parte do folclore das redações, nos anos 90. Acreditava-se ingenuamente que o mecanismo de copiar e impor opinião era a caricatura perfeita daqueles dois. Mas a piada nada tinha de exclusiva, dura até hoje e funciona bem em todos os territórios porque reproduz uma situação universal. Com olhos mais cínicos – ou apenas mais bem treinados – pergunta-se hoje, casualmente, ‘nós somos a favor?’. Seja de transgênicos, de Paulo Coelho, de Big Brother ou de qualquer desses temas que dividem opiniões. É a senha para indicar que se pretende adotar, por conveniência, uma postura, ou melhor, impostura, que facilite a vida naquela circunstância. Gostar errado pode arranhar a imagem e reavivar atritos desnecessários.
(...)


Os códigos são conhecidos. Trata-se de não destoar. O clichê das pessoas que leem Caras ‘no cabeleireiro’ e que viram cenas de novela das seis ‘por acaso, quando estavam passando pela sala’ é apenas a ponta mais visível desse iceberg. A maioria esconde suas preferências com medo de maldição. Se a lista não tiver mudado, é permitido gostar, por enquanto, de jardins minimalistas, de casas clean, de mulheres magras, de sabores exóticos, de exercício físico, de cabelos lisos, de sandálias havaianas. Pelo menos enquanto elas forem vistas em lugares caros (como informar, com uma sandália baratinha, que você tem dinheiro? E sem dinheiro vai ser difícil saber se podem gostar de você).
(...)


Na hierarquia do que é permitido gostar, a simplicidade é alvo de grandes desconfianças. Clareza, precisão, começo, meio e fim podem ser confundidos com pobreza e obviedade. ‘O artigo é bárbaro’ como todos os outros que ela publica todo mês na revista: nos faz pensar nessas exigências da sociedade em se adaptar à moda, em ter que ser aceito sendo um igual aos demais. E li esse artigo só depois de ter ido ao banco na sexta-feira fechar uma operação de câmbio: para ser bem tratada, vesti terninho, coloquei salto alto – eu, uma pessoa que vive de chinelo e camiseta e que não se preocupa nem um pouco com a aparência (salvo quando quero ser perua! Mas isso é um estado de espírito). Verdade, verdadeira: fui bem tratada. E essa estratégia veio depois de eu querer comprar um carro à vista e, por estar de bermuda e camiseta, quase que a vendedora riu da minha cara...

Sem contar as vezes que você gosta do que a mídia te faz gostar: eu não via Big Brother porque acho ridículo mas, todo mundo fala disso e eu me sentia por fora dos assuntos... O que é que eu fiz? Comecei a assistir!

Realmente, na prática, é muito difícil ser autêntico sem ficar parecendo um ser de outro planeta ou uma pessoa que realmente não se encaixa. Citando a citação da própria Marta Gêes no artigo, ‘é bom que exista de tudo, mas podem deixar que a gente mesmo escolha’, disse Nina Horta.

Escolher, eu até escolho, mas nem sempre você consegue fazer o que quer sem ter que se adaptar – e olha que eu costumo ser firme nas minhas decisões. Na maioria das vezes, isso é uma chatice, viu!?

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