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16.3.07

Neve: livro não � tudo que se espera

Ka, poeta turco refugiado em Frankfurt, na Alemanha, vai ao enterro de sua mãe, em Istambul. Lá, resolve ir para Kars, uma pequena cidade turca, que leva um dia e meio de ônibus para chegar. Ele levou três dias por causa da nevasca.

Ele decide ir para a cidade com a desculpa de escrever para um jornal de Istambul sobre moças muçulmanas que estão se suicidando na cidade: elas não aceitam tirar o véu, conforme o Estado vem exigindo para que possam frequentar a faculdade. Mas, ao mesmo tempo, o suicídio é condenado pelo islamismo: para afirmar sua religiosidade, estão cometendo um pecado. Enfim, os suicídios são somente uma desculpa para ele ir à cidade rever Ipek, uma amiga de sua época de faculdade.

A discussão do livro, que tem como tempo de acontecimentos três dias (os dias em que a cidade fica incomunicável por causa da neve que não para de cair), é sobre os ideais e as lutas de ideais entre um Estado secularista e os islamitas – conflitos raciais e religiosos. Além disso, os personagens exigem de Ka que decida se é ou não ateu – algo que parece essencial para a sociedade deles.

Enfim, o livro extremamente moroso (imagine: quase 50 páginas para 3 dias), o que cansa a leitura. E como é um assunto que não compreendo tão bem, já que é uma outra cultura, uma outra forma de ver e exigir as coisas da vida, o livro exige uma grande concentração. Até aí, tudo bem. Mas, o desfecho é sem graça, a história não tem um fim.

Mas, claro, tem suas partes interessantes. Vou transcrever aqui as falas de um jovem curdo, que discutia com vários outros, de várias facções e religiões, o que escrever para o jornal alemão, que Ka inventou que trabalhava (ele fazia um freelancer para um amigo em Istambul, e não em Frankfurt), para que o Ocidente – gente hipócrita, segundo eles – soubesse o que pensavam as pessoas do Oriente:

“O maior erro da humanidade, a maior ilusão dos últimos mil anos é a seguinte: confundir pobreza com estupidez. Através da história, os líderes religiosos e outros ilustres homens de consciência sempre alertaram contra essa confusão vergonhosa. Eles nos lembram que, como todo mundo, os pobres têm coração, mente, humanidade e sabedoria. (…)

As pessoas podem lastimar a sorte de um homem que passa por dificuldades, mas quando toda uma nação é pobre, o resto do mundo imagina que todo o seu povo deve ser desmiolado, preguiçoso, sujo, um bando de imbecis grosseiros. Em vez de inspirar piedade, esse povo provoca gargalhadas. Tudo é uma piada: sua cultura, seus costumes, seus usos. A certa altura, no resto do mundo, algumas pessoas podem começar a sentir vergonha por terem pensado assim, e quando olham em volta e veem imigrantes daquele país pobre limpando o chão e fazendo outros trabalhos mal remunerados, naturalmente começam a se sentir preocupados com o que pode acontecer se um dia esses trabalhadores se levantarem contra elas. Então, para evitar que as coisas degringolem, começam a mostrar interesse pela cultura dos imigrantes e às vezes chegam a fingir que os consideram como iguais.”

Vem cá, fala sério: que tapa na cara, hein!?
É de se pensar: será que o terrorismo começa assim?
Essa postura é a cara dos imigrantes na Europa, não!?
Será que o Brasil está muito longe dessa realidade?

Por essas discussões, o livro compensa, mas, eu não indico. Político demais e ao mesmo tempo, superficial – é a minha opinião, é claro! Quem sou eu para julgar mal o livro?

Para quem busca uma leitura que vá além da ficção e aborde temas complexos, 'Neve' é uma ótima opção. A história é rica em detalhes e te convida a uma reflexão profunda sobre a sociedade. Mas atenção: a abordagem política pode ser intensa.
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